Introdução
Começo, hoje, o meu trabalho como blogueiro , falando de uma questão que considero fundamental e que estará, de modo geral, perpassando os diversos assuntos que iremos abordar neste espaço: o processo educacional. A educação é um tema que está na “moda” e na agenda de discussão de diversos grupos socais. Empresários, trabalhadores, pedagogos, sociólogos, políticos etc., todos falam sobre ela. Frente a essa diversidade de grupos que tratam do assunto, fica a pergunta: de que educação estão falando grupos diferentes e que, geralmente, tem interesses e ideologias opostas? Na verdade, trata-se de um tema amplo e complexo e que exige uma reflexão em que o assunto seja enfocado não só pelo seu lado técnico ou pragmático, mas, fundamentalmente, em suas bases filosóficas. Portanto, desejo começar expondo algumas visões que, em si, não podemos dizer que são falsas, mas sim incompletas. Feito isso, passaremos a discutir a visão que, acredito, está mais próxima daquilo que é a “essência da educação”.
1. A visão do senso comum sobre a educação.
De modo geral, podemos dizer que a educação, na visão do senso comum, está associada,basicamente, à formação escolar dos indivíduos. Obviamente, ninguém pode negar importância da escola no processo educacional, mas, sem sombra de dúvida, ela não se resume apenas a essa dimensão. Essa visão é muito pobre e ,quase sempre, leva a uma posição preconceituosa em relação àqueles que “não estudaram”, ou frequentaram apenas o ensino básico. Como consequência dessa visão, “os que estudaram”, são vistos como pessoas “cultas” e os que não o fizeram ou que, por algum motivo, não o puderam fazer, como “incultos”.
Se a evolução da sociedade dependesse apenas da instituição escolar, que é historicamente uma instituição muito nova, estaríamos ainda na Idade da Pedra. Muito antes de existirem escolas, o homem já buscava respostas para suas angustias existências e seus problemas práticos, o que o levou a criar conhecimentos que sustentaram grandes civilizações. Em que escola estudou Pitágoras, Tales de Mileto ou Sócrates? Só para ficar nos exemplos mais famosos! Acreditar que é somente através da escola, em sentido stritu sensu, que podemos aprender , além de ser uma visão muito simplista, implica em deixar de fora, por exemplo, as sociedade tribais, nas quais existe educação, mas não a escola tal como a concebemos nas sociedades complexas. Nestas sociedades, a educação é um processo que envolve a vida como um todo. As crianças e os jovens aprendem imitando os mais velhos, convivendo com eles. Comparando o modelo moderno com o tribal, ou o das comunidades tradicionais, podemos perceber que, enquanto na sociedade moderna, lidamos com uma série de coisas que, superficialmente, sabemos como funcionam, mas desconhecemos seus fundamentos , como os computadores, por exemplo,(excluindo é claro os que são especialistas nesse assunto) , nas sociedades tribais, cada pessoa tem pleno domínio dos saberes necessários a convivência social e a sua sobrevivência.
Mesmo nas sociedades complexas, essa visão de educação mostra-se muito parcial, pois, o que não faltam são exemplos de pessoas autodidatas em campos como a música teatro, pintura. Há pessoas, por exemplo, que nunca estudaram gramática na escola, mas que falam de maneira mais adequada , articulada e coerente do que muitos que a “estudaram”. Assim, na visão do senso comum, valoriza-se a pessoa com diploma e despreza-se, ou não se dá o devido valor, a quem aprende por outros caminhos. Um agricultor, por exemplo, muito embora não tenha feito um curso de agronomia , conhece muito bem as propriedades da terra, o ciclo das estações do ano etc.
A verdade é que se aprende na vida como um todo. Aprendemos sobre psicologia nas nossas relações familiares; sobre politicas públicas nas ONGS. Sobre economia na militância sindical ou partidária. Aprendemos sobre ética e cidadania na relação com os poderes públicos e outras coisas, inclusive, com os professores na escola. Não se trata, é claro, de dizer que a escola não é importante, mas apenas de reconhecer que se ela é uma condição necessária para o aprendizado, não é , por si só, uma condição suficiente para o processo educacional.
1.2 A visão da educação como formação puramente profissional.
Muitas vezes escutamos alguém dizer: “Estude para ser alguém na vida”. Ora, o que significa isso? O que é ser alguém na vida? É simplesmente ter sucesso profissional, financeiro? Acreditamos que não. Educar é muito mais que instruir alguém ou dotá-lo de conhecimentos técnicos e científicos. A educação deve, antes de tudo, formar o indivíduo na sua totalidade, nas suas várias dimensões e potencialidades. É o que os antigos gregos chamavam de Paidéia, ou formação do integral do homem.
Essa visão pragmática da educação é reducionista e faz com que o processo educacional torne-se algo chato, desinteressante e que faz da escola uma instituição sem vida, um espaço morto ,no qual impera a formalidade , a falta de motivação e de criatividade. Isso não significa descuidar da nossa formação profissional escolar, que é importante, mas devemos enfocá-la como algo que faz parte de um processo maior, no qual o próprio ato de aprender seja valorizado. É preciso ensinar a beleza do ato de aprender.
2. A visão filosófica da educação.
Após termos discutido a visão do senso comum da educação, apontando suas insuficiências, vamos agora nos deter sobre a visão filosófica. Começo fazendo uma associação que considero emblemática e definidora da essência da filosofia da educação: o amor ao conhecimento. No seu sentido etimológico, filosofia quer dizer amor à sabedoria. Então, o Filosofo é aquele que ama o conhecimento em si mesmo e não apenas pelas vantagens financeiras ou profissionais que esse conhecimento possa trazer-lhe. Ama-se o objeto em si, o processo de conhecer, e não unicamente seus produtos. Em outras palavras, nessa visão, amar é conhecer. Ou dito de outro modo, só conhecemos verdadeiramente aquilo que amamos. Os grandes profissionais são apaixonados pelo que fazem. São pessoas em que o processo de conhecer vem, basicamente, de fatores internos e não da pressão do mercado e, por isso mesmo, afirmam -se como protagonistas do seu saber.
Falar dessa forma, numa sociedade em que prevalece uma visão pragmática da educação , na qual acredita-se que algo só merece ser estudado se trouxer um retorno material, ou se tiver uma aplicabilidade no mercado, pode soar como uma visão ingênua, idealista. Mas, podemos retrucar: o que somos, senão os nossos sonhos? A sociedade moderna, capitalista, reduziu o homem e o saber a uma condição de mercadoria. Assim como no mito do rei Midas, hoje tudo que o sistema toca vira mercadoria: o tempo, o sexo, a religião a educação , tudo e todos são reduzidos a uma só medida :o dinheiro. Não é por acaso que vivemos uma epidemia de depressão, porque conhecer é fundamentalmente, buscar sentido para as coisas. Quando falta o sentido, falta a vontade de viver. Nossa memoria é um grande exemplo disso: só fica lá o que nos marca, o que tem sentido. Aquilo que não conseguimos ver um sentido é facilmente apagado de nossa memoria
Com efeito, vivemos tão mergulhados nesta visão utilitarista da educação que acabamos tomando-a como “natural”. Mas não há nela nada de natural. Pelo contrário, é uma noção construída socialmente e que se tornou uma ideologia hegemônica. Uma das tarefas das ciências sociais é desnaturalizar as ideologia mostrando suas reais relações com as formas de poder e controle social. A verdade é que estamos tão mergulhados nessa ideologia que acaba nos tornando cegos em relação a ela.É preciso, então, descentralizar nosso olhar. Vermos as questões de maneira mais ampla para podermos entendê-las mais profundamente.
Outro aspecto da visão filosófica da educação pode ser buscado no exemplo de Sócrates. Este, que pode ser considerado o patrono da filosofia, disse que sua busca pelo saber vinha de uma missão. Ele nos conta uma historia: Querefonte , um amigo seu, quando foi à cidade de Delfos , ouviu do Oráculo que Sócrates era o mais sábio dois gregos. Isso intrigou a Sócrates, pois, ele tinha consciência de que e não era sábio, mas, por outro lado, o Oráculo não podia estar mentido. Sócrates era um homem religioso. Viu nisso um enigma, e passou, então, a buscar uma resposta. Através de seu método filosófico, a maiêutica, Sócrates submetia seus interlocutores a uma série de perguntas que os deixava desconcertados. Depois de algum tempo, concluiu que era realmente mais sábio que eles, não porque realmente sabia, mas porque sabia que não sabia, ou melhor, tinha consciência da sua ignorância.
O que podemos extrair do exemplo de Sócrates? Em primeiro lugar, não devemos ser arrogantes. O aprender não se esgota nunca. Quanto mais sabemos, mais descobrimos o quanto temos que conhecer. Em Segundo lugar, entender que o saber nasce da dúvida. Quem não é capaz de duvidar não consegue conhecer. Mas não é a dúvida pela dúvida , que imobiliza e que leva ao ceticismo puro. Ao contrário, é a dúvida que nos coloca numa posição de vigilância crítica em relação ao nosso saber, que nos faz questionar os fundamentos dos nossos conhecimentos e das nossas práticas.
Outro aspecto que podemos buscar na filosofia de Sócrates vem da sua máxima: “Conhece-te a ti mesmo”. Ou seja, todo conhecimento deve ter por finalidade tornar-se autoconhecimento. Quem somos nós? Qual o proposito da vida? Conhecer é mais do que ter informação. A informação é apenas a matéria-prima do conhecimento. Esse oceano de informações, que é o mundo moderno, às vezes, pode mais confundir do que esclarecer. Construímos conhecimento quando somos capazes de selecionar as informações recebidas, organizá-las, analisá-las e interpretá-las. Não basta saber, é preciso pensar. Ter sendo crítico significa que , antes de emitir um juízo qualquer, devo suspendo meu julgamento para buscar fundamentos. Só depois de investigado o objeto e que posso me manifestar.
Por último, acredito que a educação deve ter o papel de realizar a diversas potencialidades humanas. Como diria o filosofo Hegel: “A verdade está no todo”. Não temos que saber de tudo, mas precisamos ver as coisas nos seus contextos, saber relacionar as várias dimensões da vida e do conhecimento. Podemos dividir o conhecimento em partes (processo de analise), mas tudo está relacionado (síntese). Nosso corpo, por exemplo, não é um mundo regido apenas por fatores internos(Genética), mas pela interação com o meio em que vivemos. Não somos só o que comemos, mas, aquilo que pensamos, sentimos , vivemos e acreditamos.
Acredito que para podermos avançar no processo educacional é preciso adotar valores e práticas que possam desenvolver a autonomia intelectual de nossos estudantes e de nossos cidadãos.
Finalizo, então, com um pensamento do educador Paulo Freire: “A educação não muda o mundo, muda as pessoas. Mas as pessoas mudadas podem mudar o mundo”.
Muito bom o blog Professor. Os textos são muito interessantes. O post sobre educação foi o tema da nossa aula de hoje e lendo, meu entendimento ficou ainda mais claro. O blog será uma ótima ferramenta para nossos estudos. Parabéns!
ResponderExcluirJá 'linkei' o seu blog ao nosso. Depois passa lá!
Tatiane de Almeida Sousa - 1º. sem. Pedagogia FMU
otimo seu blog,não esperava menos de vc.o post da educação muito real os grandes não tiveram escolas e seguimos seus pensamentos até hoje.parabens DR.sempre o seguirei. Rosa 2ºsemestre S.S fmu
ResponderExcluirOi Professor Cléber. Muito bons seus artigos, aliás como suas aulas. Que tal darmos uma dinamizada nesse blog? Dois anos de férias é muito tempo. Nesse período você já deva ter produzido coisas maravilhosas. Compartilha conosco. Nos precisamos de orientação lúcida para desenvolvermos nosso conhecimento e podermos aplicar a "vigilância crítica" a ele (amei esse termo).Bem, está feito mais que um convite, um pedido. Volte a alimentar seu Blog. Um abraço e até sexta. (sou da turma de História da FMU, 1º semestre, período da manhã).
ResponderExcluirObrigado o seu bloguer me ajudou no meu trabalho de antropologia do desporto
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